31 de julho de 2011

O papel da música no cinema africano

La vie sur terre, 1998, Abderrahmane Sissako.
La vie sur terre, 1998, Abderrahmane Sissako.

O papel da música no cinema africano

Ainda hoje, uma análise do complexo papel da música no cinema é frequentemente esquecido pelos críticos, muitos dos quais permanecem prostrados diante da ditadura da imagem. No entanto, como uma manifestação cultural, a música tem uma posição privilegiada no que diz respeito ao estudo das representações de identidade e ideologia; além disso, em seus aspectos subversivos e dialógicos, pode revelar importantes decisões do diretor relacionadas às dinâmicas do poder e da exclusão.

Considerando isso em função da importância da música dentro de numerosas culturas africanas, devemos concluir que a investigação do seu lugar continua a ser uma aspiração nos estudos sobre cinema africano. Para as primeiras cinco décadas do cinema africano, o significado da música foi entendido com relação a certos fins programáticos, como quando Ousmane Sembène e Djibril Diop Mambety se dedicaram a construir a imagem de suas nações recém-criadas. Seu trabalho pioneiro lidou com a necessidade de recuperar uma memória histórica intencionalmente obscurecida pelo imperialismo e de desenvolver alternativas aos dogmas coloniais e neocoloniais. Além disso, eles sentiram a urgência de elaborar um corpo teórico especificamente africano relacionado às praxis culturais e sociais em suas respectivas culturas. Nesse ambiente, o papel do cinema era crucial. Essa nova forma de arte, fundindo a pontência do idioma audio-visual e o legado complexo do imperialismo, passou a ser vista como um meio privilegiado de luta contra as injustiças no cotidiano desses diretores. Eles tinham consciência tanto da natureza complicada dos problemas que enfrentavam quanto do poder do cinema, através da imagem e especialmente som, de construir uma identidade autenticamente africana em oposição ao paternalismo conceitual reacionário proposto pelo ocidente.

21/8 Cineclube Afro Sembene Apresenta: Um homem que grita


Dia 21 de agosto - sábado - 19 horas
Cine Clube Afro Sembene apresenta
em homenagem ao Dia dos Pais

Um Homem que Grita (Un Homme qui Crie)

Adam (Youssouf Djaoro) tem 60 anos de idade, é ex-campeão de natação, e há 30 anos trabalha com guardião de piscina de um hotel de luxo situado no Chade, na África. Contudo, investidores compram o estabelecimento e ele se vê obrigado a ceder sua vaga para seu filho Abdel (Diouc Koma), situação que o incomoda bastante por ver nela um declínio social. Além de estar diante deste conflito pessoal, seu país passa por uma guerra civil, com rebeldes ameaçando o governo. Neste contexto, Adam precisa ajudar o governo com dinheiro ou enviando seu filho para que lute pelo país. Assim, o líder do bairro pede que Adam dê sua contribuição, mas ele não tem dinheiro, só tem o filho.

Local: Centro Cineclubista São Paulo (CECISP)
Rua Augusta, 1239 - salas 13 e 14 - metrô Consolação
Entrada franca - Informações: (11)3214-3906
  
Confira mais informações no site do Cine Afro Sembene (clique)

28 de julho de 2011

Souleymane Cissé - Yeelen (1987)


Mali/Burkina Faso/França/Alemanha Oriental/Reino Unido | Souleymane Cissé | 1987 | Drama/Fantasia | IMDB 
Bambara/Francês | Legenda: Inglês (hardsub)/Português/Espanhol/Russo
105 min |
740.2 Mb

Yeelen / A luz

Dotado de poderes mágicos, um jovem parte em busca de seu tio para pedir ajuda em uma luta contra seu pai, um feiticeiro que o havia abandonado e agora procura a morte do próprio filho.  

"O argumento surgiu em um momento de tensão, a todos os níveis. Por causa do medo de perder tudo. No Mali, como em toda a parte, as pessoas já não se reconhecem. Que cultura escolher? O que se possui na realidade? O que não se possui? Podemos ter a impressão de que um cataclismo se abateu sobre o continente africano... ambientei a história a dez séculos atrás para que os jovens reencontrem a noção profunda de sua cultura."
Souleymane Cissé (Fonte)
 

25 de julho de 2011

Nacer Khemir - El-haimoune (1986)



Tunísia/França | Nacer Khemir | 1986 | Drama | IMDB 
Árabe | Legenda: Português/Francês/Inglês/Alemão
95 min | 749,6 Mb

El-haimoune / Andarilhos do deserto
Primeiro filme da Trilogia do Deserto, teve a colaboração da aclamada diretora tunisiana Moufida Tlatli ("Silêncio do Palácio" e "Tempo de Espera"). Seguindo a tradição árabe de contar histórias e sua experiência como escritor, Khemir cria um cenário especial no qual um jovem professor assume a escola de um pequeno vilarejo no meio do deserto. Fortemente influenciado pelas histórias das Mil e Uma Noites, o filme mostra figuras lendárias que se materializam, crianças que correm por labirintos, além do misterioso desaparecimento do professor. Neste filme é possível verificar como a lenda, a tradição e o destino estão fortemente ligados àquela comunidade. 

16 de julho de 2011

Souleymane Cissé - Finyè (1983)


Mali | Souleymane Cissé | 1983 | Drama | IMDB 
Bambara | Legenda: Português/Francês
105 min | 1,36 Gb 

Finyè / O vento
Dois adolescentes malineses, Bâ e Batrou, oriundos de classes sociais diferentes, encontram-se no liceu e tornam-se namorados. Bâ é o descendente de um grande chefe tradicional. O pai de Batrou, governador militar, representa o novo poder. Os jovens pertencem a uma geração que recusa a ordem estabelecida e põe em xeque a sociedade.

"Na vida de cada ser humano, há sempre momentos em que você precisa fazer uma pausa, a fim de descobrir o que tem sido feito e o que ainda precisa ser feito. Finyé coloca esta pergunta dupla." Souleymane Cissé

Prêmios:
1982: Carthage Film Festival - Tanit d'Or
1983: Ouagadougou Panafrican Film and Television Festival - Grand Prize: Etalon de Yennega
 

15 de julho de 2011

AfricaMakiya Produções - Pathyma (2010)



Phatyma, personagem criada por Paulina Chiziane, é uma menina que vive no sul de Moçambique e traz suas reflexões acerca da vontade de conseguir unir harmonicamente suas tradições com a necessidade de modernizar-se.

10 de julho de 2011

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Belo Horizonte - Mostra de cinema árabe



A Casa Una de Cultura escolheu como tema para sua programação de julho a cultura árabe, a fim de proporcionar ao público uma oportunidade para conhecer um pouco mais da história e da cultura desta região. Fará parte da programação a prestigiada “Mostra de Cinema Árabe”, que já esteve em exibição em Brasília e São Paulo durante o mês de junho. As exibições serão gratuitas e ocorrerão entre os dias 9 e 16 de julho.

Segundo a curadora da Casa Una, Izadora Fernandes, a principal característica da produção cinematográfica árabe é o fato de privilegiar um cinema feito por pessoas, com histórias muito ricas. “Esses filmes são feitos com a clareza de que o mercado cinematográfico é uma conseqüência e não uma meta. É um cinema feito a partir da necessidade de expressar idéias e desejos”, ressalta.

A mostra reúne nove filmes, produções recentes, que tratam de questões cotidianas, vivenciadas pela sociedade dos sete países representados: Argélia, Egito, Emirados Árabes, Marrocos, Palestina, Síria e Tunísia. São obras da nova geração de cineastas, aclamadas pela crítica internacional, e que fizeram parte dos principais festivais mundiais – Cannes, Sundance, Toranto, Veneza e Berlim -, selecionadas por Nágila Guimarães, Dora Bochoucha e Lina Menzli, curadoras da mostra.

Entre as produções premiadas: Cidade da Vida (2009), de Ali Mostafa, primeiro filme dos Emirados Árabes a ser distribuído nacional e internacionalmente; Outra Vez (2009), de Joud Said, o mais jovem diretor sírio a concluir um longa-metragem; Microfone (2010), de Ahmad Abdallah, primeiro filme egípcio a receber o prestigioso prêmio The Golden Tanit do festival de Cartago 2010; e Fora da Lei (2010), de Rachid Bouchared, filme indicado ao Oscar 2011 de melhor filme estrangeiro.

As mulheres também marcam presença na mostra. Será apresentado Salt of this Sea (2008), primeiro longa-metragem de Anne-Marie Jacir, que estréia no festival de Cannes; Um a Zero (2009), de Kamla Abu Zekri, campeão de bilheteria no Egito e festivais internacionais.
Em Belo Horizonte, a Mostra de Cinema Árabe exibirá também o documentário, VHS Khaloucha (2006), de Néjib Belkadhi, a história hilária de um cineasta amador que produz longa-metragens em VHS.

Confira a programação completa: programacao_mostra_cinema_arabe

César Paes e Raymond Rajaonarivelo - Mahaleo (2005)

Madagascar | César Paes e Raymond Rajaonarivelo | 2005 | Documentário/Musical | IMDB 
Malgaxe/Francês | Legenda: Português/Francês/Alemão/Inglês
1h 37min | 1,345 Gb

 Mahaleo
Em Malgaxe "Mahaleo" significa liberdade, independência e autonomia. Os sete músicos do grupo Mahaleo sempre recusaram o "show-business" apesar dos seus trinta anos de sucesso. Eles se dedicam ao desenvolvimento do país. Esses inventores do Blues Malgaxe são também cirurgiões, médico, agricultor, sociólogos ou deputado... Acredita-se que as canções dos Mahaleo levaram o povo a fazer a revolução de 1972 que levou à queda do regime neo-colonial. Hoje, eles continuam a intervir, sendo a banda mais famosa da ilha do Madagáscar. Guiado pela força e pela emoção das canções do grupo, o filme é um retrato de Madagascar hoje. (de www.mahaleo.com)

 







Entrevista com César Paes
Cesar Paes: “O audiovisual é a forma de cada país se ver a si próprio" (Fonte)
11 Novembro 2006
 
Após ter sido director de fotografia do filme “Batuque”, realizado pelo cabo-verdiano Júlio Silvão, o brasileiro Cesar Paes voltou recentemente ao arquipélago. No âmbito do Oiá - Mostra Internacional de Cinema Documental, o realizador deu uma oficina de documentário, no Mindelo, e depois apresentou na Praia vários dos seus filmes. Juntamente com a mulher, Cesar Paes dirige a produtora francesa Laterit, que se dedica ao lançamento de documentários sobre as culturas dos países em desenvolvimento.

Entrevista por: Vítor Quintã

Qual o balanço que faz desta passagem por Cabo Verde?
Foi muito interessante. Estive uma semana no Mindelo, onde fiz uma oficina de documentário, com dez pessoas. Estavam todas muito entusiasmadas e já com ideias para projectos futuros. Pudémos fazer várias experiências. Além disso, provámos que há público para documentários, porque exibi as minhas três obras e houve sempre muita gente a assistir. O meu período na Praia foi mais curto, mas o público apareceu ainda em maior número para as duas sessões que realizei.

Considera que o entusiasmo que encontrou pode ser um bom sinal para o futuro do cinema cabo-verdiano?
Estas iniciativas e a realização do festival Oiá são um bom começo, mas claro que não são suficientes. Falta muita coisa, porque, por exemplo, não há cinemas em Cabo Verde. Mas além disso é preciso também trabalho legislativo quantos aos direitos de autor, que muitas vezes não são respeitados, e ao mecenato cultural. O audiovisual é a forma de cada país se ver a si próprio, é algo demasiado importante para que Cabo Verde aceite ser apenas importador dos filmes brasileiros e portugueses.

Acha que o documentário pode ser uma aposta nos países mais pobres?
Claro que tanto a ficção como o documentário têm as suas dificuldades. Enquanto na ficção podes fazer as coisas acontecer, no documentário a câmara está humilde, à disposição das pessoas. Mas para os países do Sul, o documentário pode ser mais fácil, porque é sempre sobre coisas que a pessoa conhece. Pode ser sobre a tua cidade, o teu bairro, a tua rua, a tua avó. Além disso, não é preciso uma grande estrutura, um enorme financiamento. Há pessoas que conseguem fazer documentários sozinhas.

Todos os filmes que já realizou foram documentários. É uma escolha pessoal?
Sim, para mim fazer documentários é uma escolha pessoal, porque sinto que a realidade tem mais imaginação que eu. Eu estou sempre a ser surpreendido pelo inesperado e gosto muito de captar as pequenas maravilhas do dia-a-dia. O documentário é como a pintura, pode ser muito realista.

Nos seus dois últimos documentários, “Saudade do Futuro” e “Mahaleo”, a música tem um papel muito importante. É um apaixonado por música?
Sim, eu gosto muito de música e adoro descobrir novos sons. Mas não acho que os meus filmes sejam sobre música, acho que os meus filmes falam através da música. Ou seja, a música serve como narração, como comentário e acaba por abrir o filme a um público mais jovem.

Depois de “Angano... Angano...”, em 1989, voltou a Madagáscar para filmar “Mahaleo” (2005). De onde vem esta ligação ao país?
A minha relação com Madagáscar vem do coração, porque a minha mulher, Marie-Clemence, que é também a minha produtora, nasceu lá. Estamos entre dois continentes, porque já fizemos filmes sobre África e sobre o Brasil. Aliás, eu costumo dizer que é por isso que vivemos em França, porque fica a meio caminho entre o Brasil e Madagáscar. (risos)

Qual é a importância da sua mulher nos filmes que tem realizado?

Muita, claro, porque na verdade os nossos filmes são pensados e feitos em conjunto. A divisão entre produtora e realizador é uma separação de funções que serve mais para o exterior. Ela está sempre ao meu lado enquanto filmo, chamando a minha atenção para o que se passa do outro lado, para onde a câmara não está a olhar. E depois, na parte mais delicada, a montagem, onde o filme realmente se escreve, nós discutimos muito e às vezes passamos dias empancados, à procura não de uma solução de compromisso, mas sim de algo que realmente melhore o filme.

Como encara o sucesso dos filmes da sua produtora, a Laterit?
Temos tido sorte com os filmes que produzimos, porque têm sido vistos. Mas também penso que os nossos filmes têm um conteúdo universal, com que as pessoas se podem identificar em muitos países do mundo. Porque há muitos países em que a vida também é difícil, em que a água também é um recurso precioso, mas onde a cultura é muito forte.

Este foi um regresso a Cabo Verde, depois de ter sido director de fotografia no filme de Júlio Silvão, “Batuque”. Tem planos para voltar novamente ao arquipélago?
Claro que gostaria de poder voltar para fazer uma outra oficina, talvez sobre um outro aspecto da produção. Além disso, já há algum tempo que penso em fazer um filme que falasse através da música cabo-verdiana. Mas ainda me falta encontrar um ângulo, um ponto de vista.
 Por favor, semeie! Semear é muito importante para que outras pessoas tenham acesso ao filme.
Créditos da postagem a mfcorrea, no MakingOff.

6 de julho de 2011

Teresa Prata - Terra Sonâmbula (2007)

Moçambique | Teresa Prata | 2007 | Drama | IMDB
Português | Legenda: Português
96min | 700 Mb

Terra Sonâmbula
Primeiro longa-metragem da diretora Teresa Prata, o filme é baseado no premiado livro homônimo do escritor moçambicano Mia Couto.

Terra Sonâmbula é um road movie moçambicano. Duas histórias separadas pela guerra e unidas por um diário. Entre a Guerra Civil e as histórias de um diário perdido, o menino Muidinga e o velho Tuahir são os heróis deste filme. Eles movem-se entre refugiados em estado de delírio. Para não enlouquecerem, têm-se um ao outro. A estrada por onde caminham, como sonâmbulos, é mágica: entende os seus desejos e move-os de um lugar a outro, não os deixando morrer enquanto eles não alcançarem o tão sonhado mar.

Prêmios:
International Film Festival Kerala, Índia (2008) – Prémio FIPRESCI
Pune International Film Festival, Índia (2008) – Melhor Realização
FAMAFEST, Portugal (2008) – Prémio da Lusofonia
Asian, African and Latin American Film Festival, Milão (2008) – Prémio SIGNIS
Indie Lisboa, Portugal (2008) – Prémio do público e menção honrosa da Amnistia Internacional
Festival Internacional de Cinema de Bursa, Turquia (2008) – Melhor Argumento





Créditos da postagem a Anderson, no MakingOff.



Entrevista com a diretora

Crítica: Terra Sonâmbula, de Teresa Prata

Ainda estava a iniciar os seus estudos de cinema em Berlim quando descobriu, num canto de uma livraria espanhola, Terra Sonâmbula, de Mia Couto. E envolveu-se tanto na sua leitura que teve vontade que «o livro não acabasse nunca». Teresa Prata pouco sabia na altura de argumento ou realização, mas imaginou os seus primeiros grandes planos. Não perdeu tempo e decidiu escrever logo à Caminho, editora do escritor moçambicano, pedindo autorização para fazer daquela história um filme. Levou tempo, mas uma dúzia de anos depois, aí está a sua Terra Sonâmbula. É a primeira longa-metragem da realizadora que antes assinou várias curtas.
Não faltaram a Teresa Prata as razões para querer filmar Terra Sonâmbula. A começar pela «profundidade» da história: «Toca todos os pontos essenciais, vida, morte, sobrevivência, amor». Mas também a sua «originalidade». E a universalidade do que é contado. «É uma história africana, fala-se de Moçambique, mas uma guerra é sempre uma guerra. Por outro lado, no filme não há só uma criança à procura dos pais, mas também uma criança a crescer, o que é universal».
Pesou também por certo o facto de Teresa Prata ter vivido a sua infância em Moçambique, de onde saiu em 1975, com oito anos. Mudou-se então para o Brasil e mais tarde veio para Coimbra, onde se licenciou em Biologia, integrando também o elenco do CITAC, durante seis anos. Do teatro passou ao cinema, já que desde criança que gostava de contar histórias e percebeu que melhor o faria atrás de uma câmara do que em palco como actriz. Só voltou a Moçambique para rodar Terra Sonâmbula e teve na equipa muitas pessoas que tinham vivido a guerra e perdido toda a família. «Perguntavam-me por que queria fazer este filme», recorda. «E eu respondia-lhes que o ia utilizar como se fosse uma lente para verem a guerra e a sua realidade com um pouco mais de poesia».
Mia Couto, que em Junho vai publicar um novo romance intitulado Venenos de Deus, Remédios do Diabo, com a chancela da Caminho, não deixa de confessar que um escritor ainda que de uma maneira «ocultada» tem sempre a «esperança de rever» o que escreveu noutra linguagem, quando os seus livros passam ao cinema. «A linguagem cinematográfica tem que ser divorciada e construída com toda a liberdade sobre a sugestão do livro. E quanto mais distante, melhor será o resultado», reconhece. «É portanto uma relação sempre difícil para o autor, porque por um lado está-se revendo no filme, mas sabe que já não é uma coisa sua. Como quem olha para um filho e já não reconhece aquela criança que parecia ser sua». No caso de Terra Sonâmbula adianta: «Sabendo que Teresa Prata teve poucos recursos em condições difíceis, produziu um trabalho honesto, limpo, digno». Mia Couto já teve algumas das suas histórias adaptadas ao cinema e ao teatro, nomeadamente em algumas curtas de realizadores moçambicanos e há outros projectos de longas-metragens. Mas o seu universo será tão aliciante quanto difícil de passar a outras linguagens. Há sempre o alto risco de se perder na passagem a riqueza da sua singularidade, o envolvimento mágico, o poder encantatório das suas narrativas. Requer, nessa medida, alguma escrupulosa coragem na adaptação ao cinema. Em Terra Sonâmbula, a cineasta encarou o «desafio do livro», sem nunca perder de vista a natureza distinta das duas linguagens, a literária e a cinematográfica. «Uma é para ser lida, a outra para ser vista», salienta. «Foi um trabalho feito com cuidado, pensado. Quis começar de uma forma realista e acabar de uma mais mágica e segui esse conceito também nos diálogos. Primeiro são mais duros e depois fui deixando alguns ‘diálogos puros’ do Mia Couto». E acrescenta: «O meu filme é a minha visão sobre o livro e retirei dele o que me interessava contar».E o que Teresa Prata quis contar foi a história da criança, Miudinga, e do velho Tuahir, seu companheiro na deambulação em busca da mãe, que acredita ser a mulher que espera o seu filho, num navio encalhado, como diz o diário que encontrou junto de um cadáver. «Só peguei num esqueleto narrativo», adianta. «Por exemplo no livro de Mia Couto as duas histórias nunca se encontram, mas em cinema se abro uma segunda linha de história tenho que as juntar. Por isso, criei um rio que não existe no livro». Ainda recorda a «alegria» sentida na cozinha do seu apartamento em Berlim, onde vive, quando teve a ideia desse rio, que fez desembocar num final com «alguma esperança». «Senti logo que era uma boa ideia», diz. Talvez tenha tido a certeza, quando as pessoas se levantaram numa explosão de, a bater palmas, no justo momento em que viram brotar esse rio, quando o filme foi exibido no Festival de Kerala, na Índia. Tem estreia comercial em Portugal marcada para 8 de Maio e a 30 em Moçambique.



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4 de julho de 2011

Mahamat-Saleh Haroun - Un homme qui crie (2010)

Chade/França | Mahamat-Saleh Haroun | 2010 | Drama | IMDB 
Árabe/Francês | Legenda: Português/English/Español
  90min | 700 Mb


Un homme qui crie / Um homem que grita
Adam (Youssouf Djaoro) tem 60 anos de idade, é ex-campeão de natação, e há 30 anos trabalha com guardião de piscina de um hotel de luxo situado no Chade, na África. Contudo, investidores compram o estabelecimento e ele se vê obrigado a ceder sua vaga para seu filho Abdel (Diouc Koma), situação que o incomoda bastante por ver nela um declínio social. Além de estar diante deste conflito pessoal, seu país passa por uma guerra civil, com rebeldes ameaçando o governo. Neste contexto, Adam precisa ajudar o governo com dinheiro ou enviando seu filho para que lute pelo país. Assim, o líder do bairro pede que Adam dê sua contribuição, mas ele não tem dinheiro, só tem o filho.
Prêmio do Júri no festival de Cannes 2010.
 

Crítica: 
"Um Homem que Grita": elenco não profissional e diretor celebrado em festivais
Um raro produto da cinematografia do Chade, coproduzido com a Bélgica e a França, "Um Homem que Grita" coloca as preocupações políticas e humanistas de um diretor já conhecido dos festivais internacionais, mas inédito até aqui no circuito comercial brasileiro: Mahamat Saleh Haroun.

O diretor estudou cinema e jornalismo na França e já apresentou em Cannes "Abouna, Notre Père" (Quinzena dos Realizadores de 2002) e teve outros de seus filmes ("Bye Bye Africa" e "Darat, Dry Season") premiados no Festival de Veneza, respectivamente em 1999 e 2006.

Em "Um Homem que Grita", vencedor do Prêmio do Júri em Cannes 2010, Haroun volta ao tema constante de sua filmografia, os efeitos devastadores da eterna guerra civil no Chade, que já dura mais de 30 anos.

A questão política é filtrada pela questão humana de um pai, Adam (Youssouf Djaoro), ex-campeão de natação e agora salva-vidas da piscina de um hotel de luxo.

De um lado, ele é pressionado pela privatização do hotel, que o empurra para a função de porteiro, deixando o posto para seu próprio filho, Abdel (Diouc Koma). De outro lado, Adam tem pela frente o governo, que o chantageia a pagar em dinheiro pelo esforço de guerra contra os rebeldes ou entregar voluntários para o exército. Adam não tem dinheiro, portanto, deve conformar-se com o recrutamento forçado do próprio filho.

Colocando em tintas sutis este conflito moral e ético imenso, Haroun radiografou uma situação dramática comum a vários países africanos, tornando-a não só acessível a plateias internacionais, como rompendo com a virtual invisibilidade da África no mundo do cinema.

Uma chave da autenticidade está nas interpretações naturalistas de um elenco predominantemente amador – inclusive o impressionante protagonista, Youssouf Djaoro, que foi premiado pela atuação no Festival de Chicago.

Djaoro, aliás, produziu grande impressão já no Festival de Cannes, onde o filme teve sua première mundial, num ano em que a seleção do evento privilegiou narrativas com figuras paternas fortes – duas delas foram os vencedores do prêmio de melhor ator, o espanhol Javier Bardem (por "Biutiful") e o italiano Elio Germano ("La Nostra Vita").

Um ponto forte em "Um Homem que Grita" é como o diretor Haroun transforma a simplicidade numa ferramenta a favor da história, tornando-a compreensível, sem artifícios, nem pieguice. É o tipo do filme que cresce na memória à medida que o tempo passa.
ou

Download direto
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Créditos da postagem a caçador, no MakingOff.